segunda-feira, 14 de setembro de 2009

A TABERNA DO CATARRO E OUTRAS












As tabernas ocupavam o seu espaço nos bairros, porque os cafés se situavam nos centros das localidades. Não havia cafés de bairro, como hoje, mas sim a Taberna de A, B, C, ....Estes locais, que serviam de ponto de encontro aos operários, pescadores, trabalhadores agrícolas etc, eram apenas frequentados por homens e a estadia, praticamente era ao balcão.

A bebida mais fornecida era o chamado "copo de cinco" isto é, um copo cheio de vinho, em regra tinto, que era acompanhado por tremoços, alcagoitas, pedaços de linguiça, ou semelhantes.

Atendendo à excepcional qualidade da "murraça", aliás do vinho, com dois ou três copitos, o bebedor ficava semi-grogue. Acredito que hoje, bebendo as excelentes qualidades de vinho que se produzem em Portugal, qualquer daqueles bebedores, jamais ficaria naquele estado.

A taberna,? historicamente, terá sempre uma ligação a determinada classe social, como se cita no segundo parágrafo.

Não conheci a taberna do Catarro de que fala o Jorge Tavares, mas conheci uma taberna que se situava perto da estação, numa esquina, saindo-se em direcção ao Hotel EVA, no topo da primeira rua, que me deixou algumas marcas de humanismo, porque trabalhava lá o meu amigo ZAC, um senhor africano, de cor, de nome Zacarias.
Um dia destes vou contar a história do Zac.
Trago aqui o tema TABERNA porque foi um local que desempenhou uma função social muito importante, de tal modo que escritores como Baptista Bastos e Zola o trataram literariamente.

Vejamos o excepcional diálogo, escrito por Baptista Bastos em O Cavalo a Tinta da China.:

- A Taberna? Trata de quê?, de vinho, de bêbados?
- Não. Trata da vida, da vida de pessoas infelizes.
- Faz chorar? - Faz pensar.
- Pensar?
- Sim, a Taberna é um livro que ensina.
(Hemingway, o mestre do diálogo na literatura contemporânea não faria melhor)

Emílio Zola escreveu também a sua “A Taberna”, uma obra de 478 páginas. Quando um jornal se referiu ao livro, atacou o autor com uma brutalidade nunca vista, denunciando e acusando-o de todos os crimes, o que o obrigou, de certo modo, a explicar que, afinal, quis apenas, pintar a fatal decadência de uma família operária francesa.
A Taberna era, nesse tempo, um estabelecimento duvidoso. A Gervásia andava por lá.
È um romance sobre o povo em que não há fantasia, cheira a povo e relata a realidade.

Texto conjunto de

Jorge Tavares e
Brito de Sousa

TEMA LIVRE

PEPINOS E “BECHOCOS"

De Alfredo Mingau

Naquele dia Francelina pensou fazer aquela deliciosa sopa de feijão com massa e alguma couve lombarda. O desejo aliado à saudade de se deliciar com a saborosa sopa que a saudosa mãe fazia, e lhe ensinara,, levaram-na, com certo custo, a dirigir-se à dispensa. “Que maçada, como é que eu deixei acabar o feijão”. O desejo foi mais forte que a comichão e irritação que a apoquentavam na anca. Nem com pomada os furúnculos desapareciam. E a Francelina, com certo custo, vestiu o casaco, pegou na mala e saiu de casa.
O senhor António, sentado por detrás do balcão da sua loja, ali para os lados do Alto de Rodes, pensava no negócio que ia mau, e que, a falta de clientela, era sinónimo de crise que tardava a normalizar.
A loja do senhor António englobava três vertentes, taberna, mercearia e lugar de frutos e legumes.
Olhando para a rua, pela porta da mercearia, vê entrar Francelina com certa dificuldade no andar.
- Bom dia senhor António.
- Bom dia Francelina, que bons ventos te trazem?
- Ai, lamentou-se a Francelina, não me fale em bons ventos que eu estou muito mal.
Nisto e, de rompante, a conversa é interrompida pela entrada de duas “malucas” que se dirigem para o lugar dos legumes expostos, cochicham, e diz a mais gorda olhando para o senhor António:
- Senhor “Toino”, queríamos dois pepinos.
O senhor António, aproximando-se e percebendo o desejo delas, com ar muito sério, respondeu
- Só vendo pepinos ao quilo.
- E quantos pepinos tem um quilo senhor “Toino”?
- Depende do tamanho, são mais que dois, no mínimo uns três.
- E agora, “gorda”, o que é que fazemos, exclama a mais magra.
A mais gorda olha para os pepinos, pensa, e responde com um sorriso.
-Utilizamos dois pepinos e fazemos uma salada do restante. Pese os pepinos senhor “Toino”
O senhor António sorriu, pesou os pepinos, meteu num saco, recebeu o dinheiro da venda e ficou olhando-as sorridentes a dirigirem-se para a saída.
Regressando à mercearia onde a D. Francelina se encontrava sentada num saco de cevada exclamou:
- Então Francelina, apareces a mancar, o que é que te doi?
- Ora, tenho uns “bechocos” na nádega que me dói e dão comichão.
- Mostra lá Francelina, talvez eu possa ajudar.
- Não queria mais nada, mostrar-lhe o meu rabo?
- Só te queria ajudar, o que é que te trás por cá?
- Pensei fazer uma sopa à antiga, quero um quilo de feijão catarino e uma couve lombarda.
O senhor António aviou o feijão e a couve, entregou à Francelina que, levantando-se com certo custo, se dirigiu para saída enquanto dizia:
- Ponha na minha conta senhor António e tenha um bom dia.
- Está bem Francelina, vai em paz com as melhoras.
E, sentando-se, atrás do balcão, circunscrevendo com os olhos pela loja, deserta de clientes, pensou “isto é que vai uma crise”

COMPLEMENTO


COMPLEMENTO AO TEXTO DO ALFREDO MINGAU.

À entrada de Faro ( em frente do hoje Hostital Privado, e que foi em tempo palácio Mateus da Silveira) vindo de Loulé,ficava a sede da Companhia de Pescarias Cabo de Santa Maria Ramalhete e Forte, cujo administrador era o coronel Sampaio.

Neste local, que tambem servia de armazens para todo o equipamento destinado à armação do atum, ficava uma torre encabeçada por um mastro para içar bandeiras. Os farenses sabiam sempre a quantidade de atuns que eram pescados diáriamente, porque a Companhia içava as bandeiras correspondentes. Lembro-me que a bandeira nacional, significava que a pesca fora superior a 2.000 atuns. Toda a cidade vibrava!.

Vivi neste bairro, e muito perto da taberna do Catarro,aonde os pescadores da ria "matavam o bicho antes de ir para a faina ". Os que se dedicavam à pesca na armação, ficavam a residir três a quatro meses nos barracões existentes na ilha.

Jorge Tavares